sábado, 4 de fevereiro de 2012

As principais cláusulas do compromisso de compra e venda.

Apesar da experiência adquirida nesses últimos anos, ainda consigo me espantar com as cláusulas abusivas que as construtoras enredam nos contratos de compra e venda, aproveitando-se da vulnerabilidade das pessoas com quem contratam, via de regra, trabalhadores honestos que sonham com o imóvel próprio, espancando, de vez, o terror do aluguel.


Para o Código de Defesa do Consumidor toda prática abusiva é nula de pleno direito (arts. 39 c/c com o art. 51), ou seja, tais cláusulas não tem eficácia para o consumidor, mesmo que estejam inseridas num contrato devidamente assinado.


Outra peculiaridade que se deve observar é que o contrato assinado pelo consumidor é um "contrato de adesão", onde não sobra para o contratante qualquer possibilidade de interferência na construção do instrumento, ao contrário, ao consumidor só cabe aceitar o que foi imposto pelo outro contratante.


Feito essas considerações, vejamos as principais patologias nos contratos firmados com as construtoras:


a) Prazo de entrega condicionado a assinatura de financiamento imobiliário: cabe aqui um trocadilho já conhecido de todos "tostines vende mais pq é fresquinho, ou é fresquinho pq vende mais". Ora, se o financiamento imobiliário, regra geral, somente é liberado após a construção da obra, e a construção não é concluída, questiona-se: como obter então o financiamento que vincula o prazo de entrega. O consumidor entra, sem saber, numa armadilha, pois enquanto a obra não é entregue (em conformidade com a legislação municipal sobre edificações), o financiamento não é possível.


O que diz o CDC, art. 39, inciso XII - Considera-se abusiva: deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério.


b) Prazo de tolerância de 180 dias: a construtora insere no contrato uma disposição que a possibilita estender a entrega da obra quando houver uma excepcionalidade (na linguagem jurídica: força maior ou caso fortuito). Mas isso são situações de excepcionalidades. Confesso que não me lembro a última vez que tivemos aqui no Brasil um terremoto, ou um tsunami, ou uma guerra, ou ainda uma situação de grande comoção social. Este é o sentido da lei, o que for de ordinário (falta de mão de obra, chuvas em janeiro, falta de cimento etc) não é justificativa para usar o prazo em questão.


Essa questão de prazo só tem uma justificativa: coloca-se na propaganda (enganosa), uma data próxima para atrair o cliente (via de regra namorados em vias de casamento), e ao final do prazo prometido nada acontece!


c) A comissão de corretagem: Para o Código Civil (art. 722) a corretagem consiste quando uma pessoa se obriga a conseguir para outra um ou mais negócios, cabendo ao contratante o pagamento da comissão.


O que eu questiono é que o cliente não negocia nada com a imobiliária, muito pelo contrário ele (o cliente), quando procura um stand de venda é recebido por um funcionário uniformizado e identificado pela construtora, ninguém nos diz que aquele corretor é de uma imobiliária. Só sabemos depois que pagamos a corretagem, as vezes exigida como sinal, mas que não abate em nada no preço total do imóvel.

E se não bastasse isso, o CDC considera abusivo condicionar a aquisição de um serviço, mediante a compra de outro, é a conhecida "venda casada". Volto a questionar: por que para comprar um imóvel, cuja localidade eu já conheço, inclusive no plantão tenho a oportunidade de entrar num apartamento decorado, preciso pagar um corretor. Não bastaria a construtora colocar um vendedor que pudesse me dar todas as informações, tal como previsto pelo art. 6º do CDC?

d) Instituição obrigatória de arbitragem (art. 51, VI do CDC): imaginem o consumidor ao reclamar na Justiça sobre todos os problemas que já conhecemos forem surpreendidos com a notícia de que o judiciário não pode se envolver, porque o cliente se comprometeu que em caso de desavença levaria a questão a um tribunal arbitral, na Capital do Estado onde reside, ou seja, São Paulo, e as vezes na Capital da sede da empresa.

Isso desestimula o consumidor a buscar o seu direito, pois fora a suspeita sobre a imparcialidade do Tribunal eleito pela construtora, tenho comigo que ninguém vai se dispor a sair de sua cidade para ir até São Paulo, Belo Horizonte ou Rio de Janeiro para reclamar de seus direitos, daí porque o CDC diz que tal cláusula é nula de pleno direito.

e) Juros antes da entrega da obra: Essa é boa! Imaginem quão seria maravilho o mundo se todas as vezes que fossemos ao banco emprestar uma quantia, o banco nos oferecesse além do principal uma soma de juros mensais, ou seja, ganharíamos para emprestar o dinheiro do banco. Isso acontece se esse cliente for a construtora e você for o "banco". Funciona assim, o cliente paga mensalmente para a construtora levantar o edifício, e esta cobra sobre as parcelas, EMPRESTADAS PELO CLIENTE, juros, como se o cliente fosse o tomador do empréstimo. Nada mais abusivo.

f) Taxa de assessoria imobiliária: Então aparece um esperto e nos diz assim: Iremos fazer uma pré-análise do seu perfil. Faz uma simulação no site da caixa, imprime três folhas de sulfite numa impressora jato de tinta, e nos cobra R$ 3.000,00. Fácil ganhar dinheiro, concordam? Ora, essa pré-análise não serve para nada, porque até o imóvel ser entregue a vida das pessoas já mudou (desemprego, casamento, aumento de salário, promoção na empresa, mudança de endereço, morte etc). Tudo isso será levando em consideração somente no momento do financiamento, nunca três anos antes.

g) O INCC deve ser congelado no momento em que a obra não foi concluída no prazo. Não faz sentido ficar pagando a correção (sofrendo um prejuízo), se o imóvel não foi entregue. Quem deve arcar com a indenização é aquele que deu causa ao dano.

Estes são alguns exemplos que procurei explicar para demonstrar ao caro leitor e colega a furada que entramos ao comprar imóveis na planta.